sábado, 28 de janeiro de 2012

Gostos

Gosto de escrever. Gosto do Mar. Gosto de aviões e de viajar. Gosto de moda. De roupa, de sapatos, carteiras, pulseiras, colares, anéis, chapéus, tudo. Gosto de chuva, mas também de sol. Gosto de cozinhar e de comer. Não gosto assim tanto de sobremesas. Gosto de salgados e não gosto de doces. Gosto de chá, de água e sumos. Estou a aprender a gostar de café. Gosto de verniz apesar de roer as unhas e não as pintar. Gosto de perfumes. Gosto de muita gente a quem nunca o disse. Gosto da vida mesmo nos dias difíceis. Gosto de muita coisa. Descobri até que gosto de costurar para a M e suas filhotas.

É provável que este blog possa ser definido em mais do que uma categoria, ou então numa só. O Meu Blog em que falo do que gosto. E nos dias não, falarei do que não gosto, como hoje por exemplo.

Não gosto de desfazer e arrumar as malas.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Angola 2006- Parte II

Vim para Angola em Outubro 2006. A minha primeira paragem foi no Sumbe na Província do Kwanza Sul. Vim sozinha e à aventura.
Em Portugal ficou o meu coração. Todo o resto do meu corpo veio comigo. Não aguentei mais de 24 sem chorar. Na primeira noite estava chocada. No percurso Luanda-Sumbe encontrei muitas crianças descalças, muitas palhotas. Pensava encontrar uma Angola destruída pela guerra, mas nada me preparou para tanta pobreza. Jantamos no melhor restaurante da cidade em que cada prato de comida custava 2.500 kz e ao lado miúdos lavavam os carros por 100 kz. Estava na terra dos contrastes.

Adormeci a chorar envolvida na rede mosquiteira e com um cheiro intenso a repelente. Lembro-me de acordar no primeiro dia e pensar que era um sonho. O nascer do dia neste lado do hemisfério começa as 5:30 da manha e logo com um sol enorme a entrar-me pela janela. Na primeira semana quase que caia da cama a pensar que tinha adormecido e que já deveriam ser umas 10 horas. Depois os olhos habituaram-se e o corpo já não estranahva.

É duro estar sozinha em Africa. È duro não ter ninguem com quem falar. E era ainda mas duro almoçar e jantar sem companhia. Nunca na vida me tinha sentido tão sozinha! O tempo demorava uma eternidade a passar e não havia muito para me entreter. Os livros que trouxe (uns 10) foram todos lidos nas primeiras 2 semanas. Depois valia-me a TV ou então o laptop ainda sem internet.

Na primeira semana levaram-me a visitar a obra que iria supervisionar. Sumbe-Gabela-Quibala. 167 km que demoraram 6 a 7 horas a fazer. Já na quibala cai para o chão de tão enjoada que estava. Nessse dia naõ almocei e também não tive coragem para jantar. Estava com o estomago e a alma toda embrulhada. Queria falar com os meus, queria algum conforto e não tinha rede no telemóvel.

Foi a primeira e unica noite sem falar com os meus pais e com o G. O quarto de hotel /pensão era com telhado em capim e esquisitinha como sou pus-me logo a inspecioná-lo até descobrir 2 belas aranhas que tinham feito lá o seu lar. Resultado: vim dormir para o pátio. Arranjei 2 cadeiras de plástico e por ali fiquei a dormitar, sempre atenta aos mosquitos e ás estrelas que me velavam o sono. Foi o céu mais bonito que alguma vez vi na vida. E apensar das dores de estomago, e das dores do coração consegui ver beleza no ceu que me cobria.

Até o G vir para a minha beira nunca mais voltei à Quibala. Ao fim de 2 semanas fiquei doente. Não sabia o que tinha. E o que começou com uma simples diarreia do viajante começou a deixar-me fraca. Entre suspeições de Tifo e Malária andei num fernezim entre Sumbe e Luanda e sempre como mais e mais medicação que não surtiam efeito nenhum. A obra ia-se desenrolando devagar e o tempo multiplicava-se entre visitas à obra ou repouso forçadopor mais uma noite doente. Havia até que brincasse a dizer que o meu mal era saudades ou falta de mimo.

Verdade seja dita que não house um unico dia em que me não me arrependesse de ter vindo, em que dizia aos meus pais que queria ir embora e em que o meu pai me contrapunha que tinha sido uma escolha, que tinha de ser corajosa, que já faltava pouco e que os objectivos eram para cumprir. Soube mais tarde que sempre que desligava o telefone e depois de me encorajar ele ficava  deprimido e só dizia à minha mãe que vinha buscar a menina dele.

A 28 de Novembro voltei a Portugal já com a certeza que só voltava se fosse acompanhada. As condições que tinha eram boas, o salario era ainda melhor, mas eu sou menina dos papás, menina de mimos e afectos. Sem companhia não iria voltar. Diria adeus a Africa com um sentimento de nunca mais.

 Já em Portugal descobri que a minha doença era uma intoxicação medicamentosa. Os comprimidos africanos são muito fortes, especialmente para uma miuda de 50 kg. Nstes 2 meses Angola ficou marcada por coisas boas e coisas más. Conheci 3 pessoas fantásticas: o Paulo (que em Portugal era Angolano e em Angola era Portugues), o Deva e o Malu dois Mauricianos que me abriram o coração e as portas de casa deles ( por falar nisso ainda lhes devo uma visita às Mauricias!).

Lembro com saudade os mata-bichos digno de hotel feitos pela D. Eugénia, dos seus bifes na panela e chás de erva rainha quando as cólicas apertavam. Relembro com saudade o por-do-sol purpura da Gabela, e o laranja fogo do Sumbe. Relembro o cheiro do cabrité e da terra molhada, do mato tropical a perder de vista e das cobras e macacos que habitavam entre o pé-de-cafe, bananeira e dem-dem.

Lembro-me de todas as lagrimas de todos os choros e de todos os apertos no peito que tive. Na altura pensava que me iriam matar, mas estava enganada. Tornaram-me mais fortes, mais mulher, mais lutadora. Hoje não me arrependo um unico minuto desses dias que passei sozinha. Fui obrigada a crescer e pela primeira vez na vida a enfrentar dificuldades. Aprendi que nada é em vão e que podemos tirar lições de todas as situaçõe da nossa vida sejam elas boas ou más.

Agradeço a Africa a oportunidade de me ter obrigado a crescer e a entender que o mundo de fadas não exite. Mas também agora vos digo. Este mundo cão é bem mais interessante de se viver!

Eu e Angola Estamos juntas...
para sempre

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Lar Doce Lar

Chegamos. Estamos em casa. O nosso cheiro continua por aqui, as nossas coisas também. Gostamos de estar em Portugal mas também ao fim de 5 anos também já nos sentimos em casa deste lado do Mundo. Para a M este é o Mundo dela, este é o seu espaço, o seu ninho, apesar de ainda chorar pelos avós e pelos tios.

Era tão bom que pudéssemos estar aqui todos juntos. Era tão bom tê-los cá na nossa rotina e no meio das nossas coisas. Mas não pudemos. Mesmo nós apesar dos 5 anos ainda somos intrusos, ainda dependemos de um visto que acaba em Março e tem de ser renovado. Anualmente. Uns anos é mais fácil, outros são mais difíceis, mas em todos os anos por essa altura há sempre a incerteza de algo estar errado, de faltar um papel, de dizerem que já não temos lugar aqui.

Era bom que já pertencêssemos a este lado do Mundo, era bom que nos aceitassem como iguais. Mas a vida não é feita só com as nossas vontades e temos de respeitar também as vontades dos outros.

Para já é bom está por aqui. É muito bom estar na nossa primeira segunda casa.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Irfilha

Depois de ler um post da coco aqui á uns dias, percebi que tipo de amor sinto pela M. Até ao nascimento da Matilde tinha uma amor de irmã! Um amor incondicional, cúmplice que me levava a dar tudo por ela, a esconder as asneiras dos pais, a arranjar 1001 motivos para as chegadas tardias, para os deslizes, para os stresses. Era a minha manuxa, que eu vi crescer e que partilhou o quarto comigo durante 8 anos (depois mudamos de casa)! Quando a Matilde nasceu eu conheci outro tipo de amor. O amor de mãe. Aquele que a minha mãe sempre me disse ser incapaz de explicar. E que como alguém tão bem descreveu "é apenas o nosso coração a bater fora do nosso peito". Foi ai que percebo que metade de mim amava e ama a M como Irmã e a outra metade ama como Filha. É por isso que cada vez que me pede ajuda pra sair, eu ajo como Irmã e ajudo-a a arranjar 1001 estratagemas para sair. É por isso que quando pede coisas emprestadas eu empresto. É por isso que sou a companhia para os bons e maus momentos. Depois há os momentos que sou Mãe dela. Que detesto as más notas (felizmente são poucas e raras). È por isso que morro de desgosto quando ela diz que me odeia e queria que eu morresse (eu também sei que é da boca pra fora). É por isso que lhe dou na cabeça quando a vejo fazer merdas. E é por isso que sonho com o futuro dela, que anseio pelas suas vitórias e com o seu sucesso, assim como sonho com o da Matilde. Também amo o meu irmão. Mas é tão diferente. Apesar de igualmente forte. Ele é o meu pilar! Aquele que mata meio mundo se esse meio Mundo tentar lixar a minha vida!
 
Amanhã a minha irfilha atingirá a sua 2ª maioridade. Entra definitivamente com os 2 pés na idade adulta.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Angola 2006 - Parte I

Fui apresentada a Angola em 19 de Outubro 2006 por volta das 5:00 da manhã.
 
Ainda não tinha saído do Porto e já estava com uma vontade enorme de chorar. Era a primeira vez longe de casa e longe dos meus.
 
O Aeroporto de Lisboa parecia muito maior agora que estava sozinha. Ás 22:00 já quase não conseguia aguentar as lágrimas. Não sei se seriam de medo ou de ansiedade. Mas tenho a certeza que metade delas eram de saudades.
 
Telefonei aos meus país e ao G. Em cada telefonema belisquei a minha perna com tanta força que fiz uma nódoa negra. Porque o fiz? Para não chorar ao telefone. Porque tendo uma dor física sabia que a dor do coração seria menor e não me trairia.
 
Entrei no avião a tremer e pela primeira vez na vida passei uma noite em claro.
 
Passei a viagem toda a falar com um desconhecido, o meu primeiro amigo em Angola. E verifiquei que com o medo e com o desconhecido aprendemos uma nova capacidade de fazer amigos rapidamente. Vencemos a timidez e o embaraço. Pensamos que se lixe, estou sozinha e mais vale arriscar. O pior que pode acontecer é virarem-nos as costas e chamarem-nos malucos (posso garantir que isso nunca aconteceu em Angola).
 
Sabia que a minha vida ia mudar, mas não sabia até que ponto.
 
Nesta altura pensava que Angola me estava a afastar de quem mais amava. Eu sabia que a culpa não era dela, mas sim da falta de oportunidades em Portugal e da maneira como este nosso País gosta de menosprezar os jovens. Mas não quero falar de Portugal.
 
Como dizia, Angola estava a afastar-me de quem eu mais amava, sem eu ainda saber que ela me estava a levar ao meu futuro.
 
Disse um até já a Portugal e quando aterrei em Luanda a minha vida mudou para sempre.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Pessoas da minha vida: Avó B.

Uma das pessoas mais importantes da minha vida foi a minha avó paterna, diria mesmo que ela foi A avó. Infelizmente não conheci a outra, mas sei pela minha mãe que o desejo que ela tinha em me conhecer era enorme. Infelizmente a vida pregou-lhe uma valente rasteira e levou-a 2 meses mais cedo.

Mas falemos da avó B, que é disso que este post fala. Foi A avó e sempre o será. É a minha alma gémea e sei que está comigo desde o dia em que nasci, até ao dia do meu ultimo suspiro quando nos voltaremos a reencontrar. Vai para 6 anos que alguém ma levou, ou que ela se deixou levar, cansada pela vida e com um percurso cheio de alegria, tristezas e muito muito trabalho e sacrifício. Em todos estes dias que passaram não sinto que me tenha abandonado, pois de cada vez que me vejo em baixo e a tristeza me persegue surge sempre algo para me tirar lá do fundo, há sempre uma lanterna suspensa no ar que me trás de volta à realidade.

Desde que a M nasceu há 2 anos e meio essa presença está cade vez mais forte. Está presente no tique das mão, na paixão desenfreada por pão, na colocação da mão na cintura e a maneira como diz "ai a minha vida", está no olhar de zanga fingida, nos seus pés calorentos quer faça frio ou sol, chuva ou neve. Estão sempre quentes e nus a pisar o chão frio como o gelo. Gosto de acreditar que uma parte da minha avó B renasceu no dia que a M saiu de dentro de mim.

O tempo não aligeirou a saudade. Ainda no Natal não consegui conter as lagrimas ao ver os vídeos antigos, ao ouvir de novo a sua voz que tantas vezes me deu conselhos, ralhetes mas também muito incentivo e que principalmente me ajudou a construir os meus sonhos.

Foi a única pessoa que eu fui incapaz de abandonar porque eu era A neta. E uma neta não pode deixar uma avó na mão.

Eu fui A neta. Aquela a quem ela ensinou a ler, aquela a quem sorrateiramente mentiu ao filho e nora para me ir arrancar de um infantário que eu odiava, aquela que me dava leite achocolatado todas as tardes, aquela que tantas vezes cozinhou arroz de ervilhas, ovos e salsichas por mimo, aquela a quem limpou as lagrimas, aquela que em plena adolescência abria mão das tardes na praia com os amigos para passa-las com ela na mercearia a ajuda-la com as "freguesas". Eu fui A neta e tenho muito orgulho nisso.

Disse-lhe vezes sem conta o quão importante era na minha vida. Ela sempre o soube. Eu sei o quão importante fui para ela. Isso basta-nos a ambas. Esta relação perdura e nada nem ninguém poderá limpar e aliviar as lagrimas que verto de cada vez que falo ou escrevo sobre ela. Eu e ela, ela e eu. Eramos uma até ela partir. Agora sou só metade de mim.


terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Passado

Eu já tive um blog de fotos onde era suposto fazer um diário de uma viagem que se iniciou em 2006. A Internet trocou-me as volta e fiquei só pela intenção. Os dias passaram e as fotos nunca chegaram a ser publicadas. Pode ser que um dia.

Eu já tive um blog onde retratei a minha gravidez. Fi-lo para a família mas toda a gente era bem vinda. Depois transformou-se num babyblog para acalmar e adoçar os corações dos avós e tios que estão longe. Teve pequenas mudanças, grandes mudanças. Falou de mim, falamos de moda, e de paixões. Poucas vezes me atrevi a falar com o coração. Não gosto de fazer os pais sofrer nem de abrir a minha alma à família do meu marido. Desse lado só ele poderá ter o privilegio de me conhecer por inteiro. Com os meus defeitos e virtudes.

Agora tenho este. Onde vou rir e chorar. Onde vou lavar e purgar a minha alma. Onde falarei de filhos, de roupa, de injustiças, dos meus pais, onde falarei de mim e onde terei cartas abertas a quem amo e me faz muita falta.

Alguns dos posts acabarão comigo lavada em lágrimas (talvez a maioria), outros acabarão com risos. Mas todos virão da minha alma. Do meu eu verdadeiro, sem máscaras e sem artifícios.